Paternidade disputada: quem inventou o doce de leite?

Paternidade disputada: quem inventou o doce de leite?

Eis uma questão que alimenta discórdia: quem inventou o doce de leite? Embora sobrem hipóteses sobre a origem desse preparo, não há consenso. Na América Latina, por exemplo, vários países disputam a paternidade dessa delícia. Argentina, Brasil, Uruguai e Chile estão nessa parada.

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Essa disputa repercutiu até na Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco). Isso porque, em 2003, a Argentina resolveu declarar o doce de leite patrimônio cultural argentino.

Entretanto, o Uruguai, o Chile e a França recorreram à agência das Nações Unidas para contestar a declaração. Para os uruguaios, o doce de leite deveria ser declarado patrimônio cultural da região do Rio da Prata.

De onde veio

Teorias e lendas não faltam aos que reivindicam a paternidade do doce para comprovar seu pleito. Vejamos:

  • Uma das histórias mais recorrentes, que puxa a sardinha (ops, o doce) para a brasa (no caso, o tacho) da Argentina, é contada pelo escritor argentino Daniel Balmaceda, no livro La comida en la história argentina. Diz a lenda que o doce teria “nascido” em 1829, na fazenda El Pino, em Cañuelas, que pertencia a Juan Manuel de Rosas, então governador da província de Buenos Aires. Na ocasião, ocorria ali uma reunião para negociar o fim da guerra civil no país. A cozinheira da casa estava fervendo leite com açúcar para servir aos presentes, mas acabou esquecendo a mistura no fogo. Quando se deu conta, ela tinha virado um delicioso creme de cor caramelo.

  • A história dos argentinos é parecida com outra, contada pelos franceses, tendo como cenário as guerras empreendidas por Napoleão Bonaparte (1769-1821). Segundo ela, o tal doce teria surgido também por acidente, cerca de duas décadas antes do esquecimento da cozinheira de Rosas. De acordo com a lenda francesa, as tropas napoleônicas recebiam uma ração de leite quente e adoçado. Certa vez, o cozinheiro responsável pelo preparo assustou-se com o barulho da batalha e deixou a bebida no fogo por mais tempo do que deveria. Resultado: o lindo creme de cor caramelo, que os franceses chamam de confiture de lait – e que é apurado em fogo lento, juntando-se leite, açúcar e baunilha.

  • Os chilenos também têm história para contar. Circula na América outra lenda ligada a San Martín (1778-1850), militar argentino que liderou o movimento de libertação do Chile e do Peru da dominação espanhola. Segundo ela, o general teria sido apresentado ao doce de leite em 1817, numa viagem ao Chile, onde a iguaria recebia o nome de manjar.

  • No Brasil há quem defenda a tese de que o doce é produzido em Minas Gerais desde a época colonial.

  • Mais sensatos, muitos estudiosos do tema lembram que se trata de uma receita bastante simples (redução da mistura de leite com um adoçante em fogo baixo) e que, além da gostosura, tinha uma aplicação prática: permitir a conservação do leite por mais tempo. Por isso, muito provavelmente tenha sido uma solução adotada em muitos lugares, por muitas culturas, em diferentes épocas.

  • Na Índia, por exemplo, é milenar a prática de misturar leite com mel e levar ao fogo para transformá-los num creme saboroso. Alguns estudiosos até apontam este o início do fio da meada que espalhou o gosto do doce de leite pelo mundo.

  • Outros dizem que o doce surgiu no oeste da Ásia, por volta do século 6, e dali foi levado para a região do arquipélago que hoje é a República das Filipinas.

  • No século 16, os espanhóis chegam ao arquipélago, que mais tarde foi estabelecido como uma de suas colônias. E teriam sido os espanhóis os responsáveis por trazer para a América a receita.

  • E por que o doce de leite se espalhou tanto e se deu tão bem entre os países latino-americanos? A explicação mais lógica é a da abundância de matéria-prima: o açúcar da cana, que passou a ser usado pelos colonizadores como conservante para outros produtos da terra, como o leite de vaca ou de cabra e frutas (um manancial para grande variedade de compotas).


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